terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Resenha: Jerusalém, Gonçalo M. Tavares


Queria ler outros livros enquanto leio o Anna Karenina, para conseguir ir mantendo o blog activo. Assim, e como já não lia um livro de um autor português há bastante tempo, decidi procurar este livro de Gonçalo M. Tavares na biblioteca. Além de me ter sido recomendado por uma pessoa com um gosto no qual confio, o livro Jerusalém foi premiado em 2007, com o Prémio Portugal Telecom de Literatura, e na sua contra-capa tem um pequeno excerto do discurso de José Saramago na atribuição desse prémio.

"Jerusalém é um grande livro, que pertence à grande literatura ocidental. Gonçalo M. Tavares não tem o direito de escrever tão bem apenas aos 35 anos: dá vontade de lhe bater!"
José Saramago
(discurso de atribuição do Prémio)

É difícil fazer um resumo da história sem vos dar alguns spoilers. Isto porque a história não é contada de forma contínua. O que significa que durante algumas páginas o leitor anda um pouco perdido, sem saber ao certo qual a ligação entre os personagens e os acontecimentos narrados.

Resumidamente, este livro narra a história de várias personagens e de como estas se vão cruzando. Diria que o enredo principal seria aquele que é protagonizado pela Mylia e pelo Ernst Spengler.
Mylia considerava-se esquizofrénica e foi assim que se apresentou ao médico que viria a ser o seu futuro marido (e ex-marido), Theodor Busbeck. Eventualmente, Theodor acaba por decidir livrar-se da mulher louca com quem casou e interná-la no mais conceituado hospício da cidade. Isto porque considerava que esta não era uma mulher saudável e que a sua ligação a ela iria manchar o seu nome, coisa que para ele era bastante importante, sendo ele um investigador muito conhecido. 
É neste hospício que Mylia conhece Ernst, um homem com um andar bastante peculiar e que lhe marcará para o resto da sua vida. 

"Ela que está com a morte fechada num sítio de onde já não sai; ela quer precisamente o perigo, aquilo que ainda a excite, que ainda revele nela energia suplementar."

Além destes personagens, Hanna, uma prostituta que vive com Hinnerk, um homem que combateu na guerra e que trouxe desta o medo com que vive diariamente. Não quero contar mais sobre o desenrolar da história, porque não quero mesmo estragar nenhum momento para quem for ler este livro. É uma história que envolve loucura, dor e até traição, não me referindo apenas ao adultério, mas também a outros tipos de traição.

"Hanna não pintava as pálpebras de cor roxa para ser amada, mas sim para que a solidão de um homem visse ali uma interrupção exuberante."

Quanto à história, acho que vale muito a pena. Inicialmente passei algumas dificuldades e cheguei mesmo a achar que este livro ia ser uma desilusão, porque não conseguia perceber nada da história. Isto porque num capítulo temos vários personagens e vários acontecimentos que, aparentemente, não têm nexo ou ligação, mas que com o desenrolar da história vai-nos sendo explicada a maneira como estes se interligam uns com os outros. O autor dá muitos saltos temporais e, por isso, inicialmente achei um pouco confuso, mas rapidamente começam a aparecer novos dados e já dá para ir construindo o puzzle desta história. 

Já a escrita do autor é fantástica, recheada de metáforas. Adorei especialmente a construção dos personagens, que, na minha opinião, foi muito bem feita e de uma forma bastante aprofundada.

Outro aspecto importante que já me esquecia de mencionar é que este livro é o terceiro volume de uma tetralogia chamada O Reino, facto que eu só soube quando estava em casa já com o livro para ler. Contudo, decidi lê-lo na mesma e não senti falta de qualquer detalhe que possivelmente estará nos dois volumes anteriores. Além disso, no fim do livro há pequenos excertos dos outros livros da série e não me parece haver grande ligação entre eles. Por isso, acho que não há problema algum em ler este livro individualmente.


"É Gada que fala. Tem quinze anos.
Entro e saio daqui. Abrem-me como uma porta e fecham-me. Fui operado durante onze anos. Dezassete vezes. Fizeram de mim uma porta durante onze anos. Abriam-me e fechavam-me. Abriam-me e fechavam-me. Também faziam da minha cabeça uma porta.
É Gada, tem quinze anos, uma cicatriz na cabeça."


terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Resenha: A Quinta dos Animais, George Orwell


"Não é a tirania que provoca a submissão, mas obedecendo à sequência inversa, são os mecanismos de submissão que propiciam o aparecimento do tirano." 

(João Bernardo, em Algumas reflexões acerca de "A Quinta dos Animais": Abril 2008: A Quinta dos Animais de George Orwel: Antígona )


Decidi ler George Orwell e optei por começar pelo livro A Quinta dos Animais, publicado em Inglaterra em 1945.

Nesta fábula muito bem contada por Orwell, é-nos apresentada a Quinta do Infantado, governada pelo Sr. Reis. 
A história começa com o anoitecer e a reunião de todos os animais da quinta num celeiro, onde iriam ouvir o que o velho Major, um porco bastante respeitado por todos, teria para lhes dizer. Este conta-lhes que havia sonhado com uma revolução na quinta, na qual eles se veriam livres das mãos dos Homens, que os obrigavam a trabalhar, para depois lhes retirarem quase todo o lucro do seu árduo trabalho.

"O Homem é a única criatura que consome sem produzir. Não dá leite, não põe ovos, é demasiado fraco para puxar o arado, não consegue correr suficientemente depressa para caçar coelhos. E todavia, é amo e senhor de todos os animais. Obriga-os a trabalhar, dá-lhes o mínimo indispensável para evitar que morram de fome e guarda o resto para si."

Após a morte do velho Major, esta revolução acaba mesmo por acontecer e o Sr. Reis, bem como todos os homens que ali se encontravam, são expulsos da quinta, que agora se passaria a chamar Quinta dos Animais. Com este acontecimento, os animais da quinta ganham esperança de poderem vir a viver uma vida melhor, aproveitando ao máximo os frutos do seu trabalho, sem a presença dos homens para os explorar. 

Na quinta, os animais aceitaram que os porcos seriam os mais inteligentes e que, portanto, estes deveriam ocupar-se da parte administrativa desta. Tinham um hino, uma bandeira e até criaram sete mandamentos pelos quais deveriam guiar os seus comportamentos, entre os quais estavam "Nenhum animal matará outro animal" e "Os animais são todos iguais". O seu objectivo era não só tornar a quinta sustentável, mas também fazer com que esta fosse a melhor quinta de Inglaterra, onde não eram precisos humanos e cujo exemplo todos os animais iriam querer seguir.

Contudo, "Todos os animais são iguais, mas alguns são mais iguais do que outros" e, assim, os animais da quinta vão sendo gradualmente divididos em duas classes, a classe dominante, os porcos, e a dominada, os restantes animais, e a igualdade deixa de existir mais uma vez, ainda sem que os dominados se apercebam disso. Isto porque os porcos fazem de tudo para que os outros animais continuem iludidos, a achar que vivem melhor do que anteriormente, com o Sr. Reis. Além disso, observamos também outro tipo de medidas, características de um governo tirano, como a repressão e o culto ao líder.

"Durante a Primavera e o Verão, labutaram sessenta horas por semana, e, em Agosto, Napoleão anunciou que também haveria trabalho aos domingos à tarde. Este trabalho era estritamente voluntário, mas qualquer animal que faltasse veria as suas rações reduzidas a metade."

Orwell pretendia que este fosse um livro fácil de ler, pois queria que o máximo número de pessoas compreendesse a sua mensagem. A Quinta dos Animais é um livro curto, mas enorme em conteúdo e, na minha opinião, devia ser de leitura obrigatória, porque toda a gente o devia ler. Esta é uma história que teria adorado ainda mais na altura em que estudei a Revolução Russa, em História (saudades!). Isto, porque este livro é uma alegoria a essa mesma revolução e é impossível lê-lo sem reconhecer personagens e o que se passou nessa altura na Rússia. Por isso mesmo, sem dúvida que o vou querer reler, porque tenho a certeza que vou retirar mais dele, de cada vez que o ler. 

Obviamente que recomendo muito.

"Doze vozes gritavam, furiosas, e todas se assemelhavam. Era agora evidente o que sucedera ao rosto dos porcos. Os animais diante da janela olhavam dos porcos para os homens, dos homens para os porcos, e novamente dos porcos para os homens: mas era já impossível distingui-los uns dos outros."

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

TAG das Redes Sociais

Para variar um bocadinho, hoje decidi responder a esta tag.

Twitter: Um livro que queres partilhar com toda a gente.


Estive indecisa, mas acabei por escolher este livro de Harper Lee. Foi um livro que li no ano passado e que adorei. Na resenha que fiz para ele aqui no blog mencionei todas as razões que me levaram a considerá-lo um dos meus livros preferidos de sempre. A história é fantástica, bem como a mensagem transmitida pela autora. Por isso, acho mesmo que toda a gente o devia ler.


Facebook: Um livro de que tenhas gostado muito e que te tenha sido recomendado por outra pessoa.




Este livro foi-me recomendado quando eu tinha 13 ou 14 anos por uma amiga mais velha. Ela falou-me tão bem dele, dizendo que era um dos livros que mais a tinha marcado, que eu fiquei curiosa e fui procurá-lo na biblioteca da escola. Foi o primeiro livro a envolver a temática do mundo das drogas que eu li e adorei. Gostei tanto, que mais tarde comprei a minha própria cópia e até reli a história, coisa que raramente acontece.

Tumblr: Um livro que tenhas lido antes de criar o blog e do qual ainda não tenhas falado.



Este livro da Jane Austen foi o que me abriu a porta para os clássicos. Li-o no início do secundário e adorei, especialmente uma das personagens principais, a Elizabeth Bennet. Além disso, adorei a maneira como a Jane Austen critica a sociedade, até mesmo através da própria construção das personagens. Desde então que tenho vontade de ler os outros livros dela, mas acabam sempre por ficar para trás... Enfim, um dia!


Myspace: Um livro que não tens intenção de reler.



Apesar deste livro representar a trilogia toda, este está aqui porque é aquele de que menos gostei. Não quer dizer que não tenha gostado da série, só não sinto vontade de a reler, especialmente este último. Algumas coisas me irritaram nele, mas o principal foi mesmo a personalidade da protagonista, a Katniss. No entanto, o primeiro livro da trilogia é o meu preferido e um dia posso vir a relê-lo, mas agora não sinto vontade de o fazer.

Instagram: Um livro com uma capa bonita.


Apesar de outras pessoas já me terem dito que preferem as capas consideradas "mais adultas" desta série, eu continuo a achar que estas são as mais bonitas. Ainda só tenho o primeiro livro desta trilogia, mas tenciono comprar os outros assim que puder (até porque ando cheia de vontade de ler fantasia!). Acho-as absolutamente lindas e fiéis ao mundo criado por Tolkien.

Youtube: Um livro do qual gostarias de ver uma adaptação para o cinema.



Responder a esta foi difícil, mas acabei por escolher dois livros que já têm adaptações para o cinema mas que eu ainda não vi. O Jane Eyre já foi lido, mas ainda não vi o filme, não sei porquê, visto que adorei o livro. Quanto ao Anna Karenina, estou neste momento a lê-lo e tenciono ver o filme assim que o acabar, até porque tem uma das minhas actrizes preferidas, a Keira Knightley.


Skype: Um livro com personagens com os quais gostarias de conversar.





Eu juro que tentei não escolher o Harry Potter, mas era o que fazia mais sentido. Ah... Tinha que ser! É mais que óbvio que ia adorar conversar com todas estas personagens! Acho que nem vale a pena explicar mais nada...


terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Resenha: The Bell Jar, Sylvia Plath


"I was supposed to be having the time of my life."

The Bell Jar (A Campânula de Vidro) é o único romance de Sylvia Plath, que na altura, em 1963, publicou o livro sob um pseudónimo, semanas antes de se suicidar.

Neste romance parcialmente autobiográfico, a autora conta a história de Esther Greenwood, uma estudante exemplar que além das excelentes notas a tudo, ganhava imensos prémios. Em 1953, Esther vai estagiar para uma revista de moda em Nova Iorque, o que ela encara como uma maneira de poder seguir o seu sonho de vir a ser escritora. No entanto, vê-se envolvida num mundo cheio de eventos, festas, brindes, roupas caras, homens desinteressantes e pessoas que ela considera aborrecidas.

"I felt very still and very empty, the way the eye of a tornado must feel, moving dully along in the middle of the surrounding hullabaloo."

"The trouble was, I hated the idea of serving men in any way."

Esther ocupava um lugar que muitas outras jovens da sua idade invejavam, mas sentia-se infeliz. Não era aquilo que ela tinha idealizado. Para piorar a situação, o curso de escrita para o qual se tinha inscrito e no qual ela tinha a certeza que ia ser aceite, rejeitou-a. A sua tristeza foi-se aprofundando e prolongando, sem ela se aperceber que já não era algo normal. Dava por ela a pensar nas melhores formas de se suicidar, chegando a tentar fazê-lo várias vezes. Esther sentia que já não conseguia escrever. Além disso, não dormia, chegando a estar um mês sem o fazer, sem lavar as suas roupas e sem se arranjar.

A certa altura é internada e passa pela ala psiquiátrica de vários hospitais. No entanto, apesar de todos os tratamentos feitos, ela continuava a sentir-se fechada e sufocada debaixo da sua campânula de vidro.

"The silence depressed me. Is wasn't the silence of silence. It was my own silence."

"'Do you know what a poem is, Esther?'
'No, what?' I would say.
'A piece of dust.'
Then just as he was smiling and starting to look proud, I would say, ' So are the cadavers you cut up. So are the people you think you are curing. They're dust as dust as dust. I reckon a good poem lasts a whole lot longer than a hundred of those people put together.'"

Este foi o meu primeiro encontro com a autora. Era um livro que já queria ler há tanto tempo, mas foi ficando sempre para trás. Agora que o li percebo o que andei a perder este tempo todo. 
Primeiro ponto: a história. O tema que mais interessa na Psicologia é a parte das psicopatologias e, portanto, adoro ler livros que envolvam personagens com algum problema de saúde mental. Mas um aspecto que torna este livro interessante, é nós não sabermos à partida o que vai acontecer. Até a própria personagem se vai apercebendo aos poucos do estado depressivo em que se está a afundar.

Segundo ponto: a escrita. Li o livro em inglês, o que me permitiu estar o mais perto possível do que a autora escreveu. A escrita de Sylvia Plath é absolutamente maravilhosa. É quase como estar a ler poesia. Fiquei com uma vontade gigante de ler tudo o que ela escreveu e ainda mais quando soube que ela considerava este livro como um "teste" e que nem gostava muito do que tinha escrito. Se ela não achava isto muito bom, então quero mesmo ver o resto da sua obra! Vou procurar ler tudo o que ela escrever, todos os contos, todos os poemas e diários, porque há fortes probabilidades de ter encontrado aqui a minha escritora preferida.

"I thought the most beautiful thing in the world must be shadow, the million moving shapes and cul-de-sacs of shadow. There was shadow in bureau drawers and closets and suitcases, and shadow under houses and trees and stones, and shadow at the back of people's eyes and smiles, and shadow, miles and miles and miles of it, on the night side of the earth."

"I took a deep breath and listened to the old brag of my heart.
I am, I am, Iam."