domingo, 23 de janeiro de 2022

The Woman in White, Wilkie Collins

Apesar de tudo o que era problemático nessa época, adoro literatura vitoriana e faço por ler pelo menos um livro dessa altura todos os anos. Desta vez, li "The Woman in White", do autor Wilkie Collins, dado que, pelo que fui ouvindo falar, seria um livro muito atmosférico, misterioso e obscuro, ou seja, exatamente o que eu queria dele. Uma das coisas que mais me agrada nos livros desta época é precisamente o aspeto gótico, a atmosfera escura e misteriosa, onde as sombras se confundem e tudo ganha uma aura meio sobrenatural. São habitualmente histórias com uma dimensão psicológica interessante, onde a sanidade e a loucura se misturam, onde percebemos que as personagens não são preto/branco, onde a moralidade de cada um é colocada em causa.

Um aspeto que adorei neste livro é a forma como a narrativa nos é apresentada. Temos várias personagens e conhecemos o ponto de vista de cada uma delas. A história é contada, maioritariamente, a partir do futuro, sendo que o narrador principal sabe sempre mais do que nós, incluindo o desfecho da história. Isto foi feito de forma a que ele nos vá deixando essa sensação, de que algo aconteceu e que agora nos serão apresentados todos os factos, o que nos vai alimentando a curiosidade, fazendo com que um livro de mais de 600 páginas não tenha esse peso.

A história começa com Walter Hartright, um professor de pintura, que agarra uma oportunidade de trabalho numa mansão onde vivem duas jovens com o tio de uma delas (acamado e de saúde muito debilitada). À noite, enquanto se dirigia para essa mansão, cruza-se com uma mulher vestida de branco, com quem tem uma curta e estranha conversa, em que esta lhe dá a entender conhecer bem o local para onde ele vai trabalhar. Posteriormente, percebe que esta mulher havia fugido de um asilo e estava a ser procurada.

Não adiantarei mais sobre a narrativa, visto que é muito mais interessante ir desfiando este novelo em conjunto com as personagens. Muito vai acontecer ao longo da história, mantendo-nos sempre muito atentos e com vontade de querer saber mais. Afinal, quem é aquela mulher? De que forma é que conhece aquela família? O que é que ela quer?

Gostei mesmo muito deste livro, embora as últimas 200 páginas me tenham custado mais a ler, porque senti que o autor aí já se tornou repetitivo. Contudo, valeu imenso a pena e tornou-se num dos livros vitorianos que provavelmente mais recomendo. Mesmo sendo um livro escrito por um homem na época vitoriana, e mesmo tendo alguns aspetos discutíveis no que diz respeito à representação da mulher (o que é natural para aquela altura), tem uma das minhas personagens femininas preferidas, a grande Marian Halcombe.

quarta-feira, 24 de novembro de 2021

O Alienista, Machado de Assis

Outubro, mês da saúde mental, pareceu-me o mês certo para conhecer a escrita de Machado de Assis, nomeadamente o conto "O Alienista", cujo tema principal é a discussão entre o que é e não é a loucura.

Sendo este um conto bastante curto, não irei escrever muito sobre ele. Trata-se da história da criação de um asilo para "loucos" e "mentecaptos", a primeira Casa de Orates. Esta foi a obra do respeitado médico Dr. Simão Bacamarte, que sentiu a necessidade de criar um espaço onde acolhesse estas pessoas, protegendo-as a elas e sobretudo ao resto da população, que de alguma maneira as considerava uma ameaça. 

Contudo, a certa altura tem quase toda a população internada e debate-se com a questão do que define a loucura. Afinal, o que é ser "louco"? O que é ter uma doença mental? Como é que distinguimos isso da normalidade?

Gostei muito da forma como o tema foi abordado e da discussão que levanta, ainda mais tendo sido publicado em 1882. Quanto à escrita em si, ainda não me cativou. Quero ler mais do autor para perceber se gosto ou não, porque neste conto não me impressionou, principalmente pela superficialidade (natural num conto, daí que também não me encante facilmente por este tipo de texto). 

domingo, 7 de novembro de 2021

A Borra do Café, Mario Benedetti

Só de estar a parar para escrever sobre este livro, já me está a dar vontade de o reler imediatamente. Foi o meu primeiro contacto com a escrita do escritor uruguaio Mario Benedetti. Entretanto já tenho na estante outro livro dele para ler, porque me apaixonei com este. Começo a conhecer-me melhor enquanto leitora e já percebi que há temas que são um ponto chave para mim, como é o caso da memória e da passagem do tempo.

Em "A Borra de Café" acompanhamos o Claudio, enquanto recorda episódios da sua infância e juventude, nomeadamente os lugares e as pessoas que os povoaram, atribuindo a cada um uma identidade muito característica e um papel importante na sua vida.


A forma como Benedetti o faz não se torna num amontoado de acontecimentos, sem qualquer ligação. A escrita bonita, com sentido de humor e alguma ironia, transmite uma ideia bastante realista da forma como as nossas memórias estão também pautadas por emoções e de como funciona quando olhamos para elas de um ponto de vista do nosso futuro.


A sensação ao ler este livro é de uma enorme proximidade com o protagonista, como se estivéssemos com ele a percorrer os caminhos da sua memória e a rever sítios, pessoas, relações e sentimentos, com o adicional pensamento crítico do futuro, que não deixa de fazer transparecer a ingenuidade e doçura de vários momentos nos quais entramos. E digo "entramos", precisamente porque me senti completamente imersa neste livro. Largava-o apenas porque tinha mesmo que ser, ou porque outras obrigações chamavam ou porque não o queria acabar, mas ia com ele na cabeça.


É um livro com capítulos curtos e uma quantidade absurda de passagens bonitas ou marcantes pela ironia ou sentido de humor, que nos deixam com um travo mordaz a pensamento crítico e ajudam a estabelecer a ligação entre autor e leitor, levando-nos àquele esgar de quem percebeu a mensagem subliminar àquelas palavras.


Já tenho comigo "A Trégua" e mal posso esperar por lhe pegar. Há algum tempo que não me acontecia gostar tanto de um livro desta forma.