sábado, 6 de junho de 2020

Eu, Yalom: Memórias de um Psicoterapeuta, Irvin D. Yalom

Nos tempos de faculdade, muitas vezes sentia que devia ir além das leituras que me eram pedidas e aventurar-me mais pelas obras dos autores que andávamos a estudar. No entanto, naquela altura, com tão pouca disponibilidade para ler, nunca trocava os meus livros de ficção por essas obras. Só que depois, em conversa com colegas que diziam andar a ler certos livros técnicos e a adorar, sentia sempre que estava a perder alguma coisa e que devia fazer um esforço. 

Eventualmente, apaziguei-me e deixei de me cobrar leituras que não me apetecia fazer. Até porque comecei a pensar que para um livro ser bom, não basta ter boas ideias, é preciso estar bem escrito; e isso nem sempre acontece. Foi também por isso que este livro autobiográfico do Dr. Irvin D. Yalom me surpreendeu tanto e me marcou enquanto pessoa e profissional. Isto, ao ponto de, pela primeira vez, ter decidido enviar um e-mail ao autor assim que terminei o livro. E ele respondeu! O que acaba por ser condizente com a imagem que criei dele com  esta leitura.

Este talvez seja um livro que recomende principalmente a pessoas que se interessem pelo processo psicoterapêutico, pela relação estabelecida nesse encontro e por conhecerem algumas histórias e o percurso profissional deste autor. Apesar de já me terem sido recomendados alguns livros dele, comecei por este, o último que ele escreveu até agora. Acho que comecei bem, porque dá-nos a conhecer a pessoa por detrás dos livros e da abordagem terapêutica. Identifiquei-me muito com a sua postura humanista e com a forma como cuida de quem o procura. Li-o na altura certa e encontrei nele a orientação e validação de que precisava.

Neste livro acompanhamos os seus tempos de faculdade, percebemos a sua admiração por alguns professores, os primeiros pacientes, os anos como professor e os primeiros esforços por transmitir conhecimento através dos livros. Vamos percebendo a sua sede por inovação e por encontrar novas formas de chegar ao outro e àquilo que nos angustia enquanto seres humanos, nomeadamente através da forma como foi explorando os grupos terapêuticos. Fazemos um caminho pela escrita dos vários livros, do que os motivou e de como foi todo o processo. Conhecemos a pessoa por detrás da obra, as suas próprias angústias e motivações e percebemos quanta generosidade dele transborda ao querer transmitir o que sabe, nomeadamente a jovens terapeutas. 

Senti-me como se estivesse a ler um livro de memórias de alguém que a certa altura parecia um amigo a falar. Daí ter-me sentido confortável para estabelecer o contacto e daí ter tido tanta pena de ler as últimas palavras deste livro. Senti estar a despedir-me de alguém e não me apetecia nada. Acredito que agora, com 85 anos, pense ainda mais na morte e no medo de que tudo se perca, mas com um legado destes, a morte pode chegar que Irvin Yalom ficará connosco ainda durante muitos anos.