Era uma falha gigante na minha vida, o facto de nunca ter lido o 1984, de George Orwell. Li há uns tempos o Animal Farm também deste autor e gostei muito. Assim sendo, decidi pegar nele este ano.
A sua leitura foi sempre muito fluída, mesmo nas partes que eu (erradamente) antevia que pudessem ser aborrecidas. Além disso, faz-nos pensar em muita coisa. Dei por mim a parar para falar sozinha várias vezes!
A sua leitura foi sempre muito fluída, mesmo nas partes que eu (erradamente) antevia que pudessem ser aborrecidas. Além disso, faz-nos pensar em muita coisa. Dei por mim a parar para falar sozinha várias vezes!
Primeiro, importa dizer que este livro é uma distopia (a mais conhecida, provavelmente), ou seja: contrariamente às utopias, neste caso temos o retrato de um mundo caracterizado pela opressão, totalitarismo, pelo endeusamento da autoridade, pela falta de liberdade, de pensamento crítico e do direito à individualidade, pelo controlo e pela utilização da tecnologia para esses mesmos fins.
Este livro foi publicado em 1949 e retrata uma sociedade imaginada por G. Orwell em 1984. Passa-se naquilo que seria o território inglês, embora neste livro o mapa geográfico não corresponda ao que conhecemos.
Esta sociedade é governada pelo Grande Irmão (sim, Big Brother, aquela casa onde eles eram vigiados o tempo todo - não foram eles que tiveram a ideia!). Não lhe conhecemos outro nome e nunca o chegamos a encontrar fisicamente nesta história. Além desta entidade, temos depois vários ministérios, cujos nomes correspondem à antítese daquilo que lá se pratica (e.g. Ministério do Amor, onde torturam pessoas; Ministério da Verdade, onde transformam a mentira em verdade e vice-versa). Além destas temos a Polícia do Pensamento, que persegue os crimepensantes (palavra da novilíngua - adaptação da língua original para uma mais simples, com pouco vocabulário, menos adjetivos e menos espaço para o pensamento e a expressão de ideias divergentes).
O nosso protagonista é o Winston, um homem que trabalha no Ministério da Verdade, onde tem tarefas diárias como ir aos arquivos da imprensa alterar certos textos incluídos em edições de jornais do passado, de maneira a que façam sentido com o presente. Por exemplo, se no atual momento temos o governo a reduzir a quantidade a ser distribuída de um certo alimento (de 3 para 2 pacotes), é necessário ir à edição do jornal em que foi dito que tal não iria acontecer e alterar essa informação, por exemplo, dizendo que iriam aumentar (de 1 para 2 pacotes). Desta forma, não só se evitava a exaltação de ânimos, visto que não se poderia dizer que o Estado estava a fazer o contrário do que prometera, como ainda dava a impressão da situação estar a melhorar e do Grande Irmão ser bastante confiável e generoso.
Este livro ainda hoje anda na minha cabeça e lembro-me frequentemente dele. Cada vez mais acho que será dos poucos que irei reler. Esta característica do emprego de Winston deixou-me a pensar. É uma ideia muito interessante (e assustadora), esta possibilidade de alterar aquilo que damos por inalterável: o passado. No livro são feitas algumas reflexões quanto a isso mesmo. A História é aqui diariamente alterada. Os livros são modificadas e tudo fica de acordo com aquilo que é desejado para evitar que as pessoas pensem pelas suas próprias cabeças. Há um ideal a ser transmitido, um modo de vida e um conjunto de ideias, ficando o mundo destas pessoas restringido a isso mesmo.
São definidos três lemas para esta sociedade e inicialmente quando os li deixaram-me intrigada. São eles: Guerra é Paz; Liberdade é Escravidão; e Ignorância é Força. Não entrarei em detalhe sobre cada um, mas devo dizer que o primeiro sempre foi o que mais me fez confusão, dado não conseguir entender como é que aquilo poderia fazer sentido para alguém (os outros também não, mas com o que sei de governos totalitários, consigo entendê-los melhor). Ao longo da leitura, compreendi do que se tratava e de como a manutenção de uma guerra, seja ela real ou não, poderá permitir a paz interna num país.
Muitas destas ideias doentias podem ser vistas à luz da teoria de Maslow e a sua pirâmide das necessidades! Se mantivermos as pessoas no nível das necessidades mais básicas (e.g. alimentação, questões de sobrevivência), elas não darão importância nem procurarão atingir necessidades mais elevadas (e.g. relações pessoais significativas, autoestima, criatividade e realização pessoal). Tudo isto protege a estabilidade de um governo e ajuda a que aqueles que estão no poder, lá se mantenham e sem grande alarido.
Muitas destas ideias doentias podem ser vistas à luz da teoria de Maslow e a sua pirâmide das necessidades! Se mantivermos as pessoas no nível das necessidades mais básicas (e.g. alimentação, questões de sobrevivência), elas não darão importância nem procurarão atingir necessidades mais elevadas (e.g. relações pessoais significativas, autoestima, criatividade e realização pessoal). Tudo isto protege a estabilidade de um governo e ajuda a que aqueles que estão no poder, lá se mantenham e sem grande alarido.
Outro aspeto interessante é que, neste sítio, as pessoas que começam a desviar-se da lente opressora do governo (literalmente, visto que eles têm telecrãs - televisões com câmaras - e microfones), não são executadas em praça pública. Essas pessoas simplesmente desaparecem e esta é uma ideia bem desenvolvida neste livro, nomeadamente o porquê disto ser feito assim. Essas pessoas não podem ser olhadas por alguém como mártires, porque a partir do momento em que são apanhadas, é como se nunca tivessem existido. Além disso, é muito provável que no momento da sua morte, já tenham abdicado genuinamente de todas as suas convicções anteriores.
Infelizmente, é impossível não comparar esta sociedade de 1984 com alguns aspetos da sociedade de 2019, especialmente se olharmos para a questão das fake news, para a forma como os nossos dados são tratados e para como acabamos por ter também um Big Brother a seguir os nossos passos (quer através das autorizações que damos às aplicações nos nossos telemóveis, quer através daquilo que nós próprios publicamos).
RESUMO PARA OS MAIS PREGUIÇOSOS:
Isto tudo para dizer que adorei este livro e que, no meu caso, sinto que se vai tornando cada vez melhor com a distância, porque continua a fazer-me pensar, mesmo depois de já estar fechado. Lá está, há quem diga que um clássico é um livro que nunca acabou de dizer aquilo que tinha para dizer! Este é um grande exemplo disso mesmo. Se ainda não leram, leiam! Vale muito a pena e lê-se muito bem.